sexta-feira, novembro 09, 2007

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Tenho sonhado tanto contigo avô.
Tenho sentido tantas vezes o teu cheiro sempre que conversamos – aquela mistura de barba recem-feita com o inconfundível tabaco.

Depois de passar o pano húmido e amarrotado (para limpar os sinais do tempo que já te levou), de por a tua rosa branca e ajeitar as fores tristes que a avó sempre deixa, sinto-te tanto.
Fecho os olhos e encosto a cara à tua mão, porque sei que estás ali, a acariciar-me o rosto. Só não percebo se com orgulho, com desilusão ou vergonha (ou apenas para amparares os bocadinhos de coração e de alma que me estão sempre a cair, e que não te deixam descansar de uma vez por todas).
Tiras os óculos da mesma forma como sempre o fizeste, para me olhar com a tal ternura e para me fazeres perceber – mais uma vez – que existimos apenas Tu e Eu. O resto não importa. Voltas a ter os olhos mais verdes do mundo na minha direcção e o toque da tua mão torna-se mais forte do que nunca. O cheiro, os olhos, o tacto! É tudo quase tão real. Não é avô?
Sinto-te porque preciso de o fazer. Porque o silencio, o silencio avô, já não me é suficiente.
Tenho-te sentido tanto. Preciso tanto de ti.

Canso-me de te perguntar se estás orgulhoso de mim. Dá-me outra resposta. Vem buscar-me. Leva-me daqui!
Quero estar contigo outra vez avô. E juro-te, quando te encontrar, seremos tu e eu, para sempre. Não largarei a tua mão pela terceira vez. Juro-te!

E já nada do que escrevo aqui parece ter sentido.

Às vezes dou com a avó a olhar para o lado e com os olhos quase fechados. Eu sei que ela está a pensar em ti. E dentro de dias fazem 4 anos que nos (me) mataste. 1460 dias a desejar morrer para estar contigo. Nem nunca me soubeste dar uma explicação. Desapareceste e pronto. Não tinhas esse direito.

Desculpa se também te matei. Tu continuas a matar-me e eu não sou capaz de te desculpar. E mais do que nunca, o silêncio já não basta.

Ultimamente, dou comigo a olhar para o lado.
E com os olhos quase fechados.

Já nada do que escrevo aqui, parece mesmo ter sentido.



* Entrei na faculdade avô.
A avó está sempre a dizer, que se cá estivesses isto seria diferente. E que os pais não teriam estas dificuldades.
Ela não percebe que tu estás aqui. - E é por isso que não temos (tenho) mais dificuldades.
Estás orgulhoso de mim? (eu sei que sou chata sempre com a mesma pergunta. Mas tu também tens sempre a mesma resposta. O silêncio. E o silêncio não é suficiente)






Enlouquecida e Farta de sentir saudades.
Cansada de chorar e de não gritar.
Com medo de afinal não te sentir, e de viver para sempre no nosso silêncio.
Medo. sobretudo medo.
a tua poetisa